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Sobre o “20 de novembro” e os primeiros moradores da região de Itaguara que se tem registro



Ao ler um artigo sobre a Missa dos Quilombos, celebrada em Recife por Dom José Maria Pires - primeiro bispo preto brasileiro - e com Milton Nascimento - como um dos mestres de música - em 20 de novembro de 1981, em exatos 286 anos da morte de Zumbi dos Palmares, missa que por cuja prosseguimos como feriado nacional da Consciência Negra: então lembrei da recente leitura de um livro que saiu do forno a pouco tempo, portanto ainda quente, dando uma visão totalmente nova das origens da cidade de Itaguara.


De acordo com as pesquisas de Rossiano Vilaça, historiador e mestre pela UFMG - também itaguarense e meu amigo de infância - sobre as origens, colonizações e tradições da região de Itaguara, formalizadas no livro Dores da Conquista (lançado ano passado), que evidenciam os escravizados da Fazenda da Conquista como primeiros moradores oficiais da região que originou esta cidade. 


Os dados foram extraídos principalmente de documentos paroquiais da época e em diversas cidades como Ouro Preto, Bonfim, Conselheiro Lafaiete, Congonhas e São João Del-Rey (os mais importantes centros da época a quem a região da Conquista respondia no século XVIII).




A Fazenda da Conquista foi criada por volta de 1760 como uma espécie de filial da Fazenda Palestina, pelo fundador de Bonfim e Belo Vale, o empreiteiro português de origem judaica: Manuel Teixeira Sobreira e seus primos, que tinham uma companhia comercial extensa: inclusive no mercado de escravizados. Conforme inventários da época, na Fazenda da Conquista - nome utilizado para terras adquiridas por batalhas judiciais naquele tempo - constava apenas com moradores escravizados: uma fazenda sem brancos. Até hoje o bairro  de Itaguara onde se situava a sede destas sesmarias ainda é chamado de “Fazenda”. Sua força de trabalho estava nos braços de seus únicos residentes: Pedro do Congo, Domingos de Angola e Joaquim da Mina. Os Sobreira somente visitavam  para fiscalizar o trabalho de seus escravos, pois usavam como morada apenas suas residências em Bonfim, Belo Vale e Ouro Preto.


Após a falência da companhia dos Sobreiras, a Fazenda da Conquista enfim foi adquirida por meio das posses de Leandro Gomes Rodrigues, de Barão de Cocais, e a herança de sua esposa: Catarina Josefa do Sacramento: filha de um fazendeiro português nas terras de Piracema, nas proximidades da Cachoeira do Açaí. O casal chegou a ter 220 alqueires de terra, da região da Matinha (sudeste de Itaguara) até a Serrinha (norte de Itaguara). Ainda moravam na região de Piracema quando perderam a única filha após o nascimento: o que provavelmente causou infertilidade em Catarina, logo, pois, nunca mais tiveram filhos legítimos registrados. Então, logicamente se deduz, este fato fez com que o casal dedicasse mais seus rendimentos na fundação da Capela e da Paróquia de Nossa Senhora das Dores da Conquista, assim também como a construção dos primeiros cômodos a serem utilizados para festas religiosas, assim dando início ao Arraial de Nossa Senhora das Dores da Conquista: que mais tarde receberia o nome tupi: Itaguara. 


O casal fez algo raro, porém, para época ao fim de suas vidas: deixaram no testamento terras como herança para seus escravizados Manoel Rebolo e Maria Benguela: fundadores do quilombo do Mato Dentro dos Forros.


Vale ressaltar outro fato: o primeiro sepultamento registrado na paróquia de Nossa Senhora das Dores: Pedro de Angola. Também no levantamento de obituários da Paróquia de Nossa Senhora das Necessidades - onde eram sepultados os primeiros Itaguarense antes da instituição da Paróquia de Nossa Senhora das Dores - de 1776 a 1801, dos indivíduos citados: 58% eram pretos enquanto 30% eram brancos. Não é um indicativo preciso da etnicidade dos conquistanos da época, no entanto se vê que morriam o dobro de escravizados na época em relação aos brancos: talvez pela força de trabalho excessiva e péssimas condições a que eram submetidos.


Claro está que os primeiros moradores da região, segundo estudos arqueológicos, foram provavelmente povos indígenas Kaxixós e Cataguases (cujos alguns artefatos encontrados no município se encontram no Museu Sagarana). No entanto, documentos oficiais do período colonial na região da nossa cidade, os primeiros moradores que se tem registro são de africanos escravizados, e que homenagearam estas serras com nomes de regiões nostálgicas de sua infância na África, tais como: Cambinda e Buta. 


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Itaguara deve profundo respeito e agradecimento aos pretos que vieram da África: de regiões da Angola, Congo, Mina, Rebolo, Moçambique, Guiné… (também a seus descendentes que residem nesta cidade) todos ainda emanando o combustível primordial que criou Itaguara, onde até hoje preservam costumes antigos de seus antepassados africanos. 


O livro Dores da Conquista, de Rossiano Vilaça, está disponível - um exemplar para cada resistente em Itaguara - com retirada na Secretaria Municipal de Cultura e Turismo. É uma leitura riquíssima totalmente baseada em dados de documentos históricos, jurídicos e paroquiais. Super recomendo. Música sugerida combinante com o tema: Zumbi, de Jorge Ben Jor. Salve, salve: Sr Valdivino - in memoriam, descendente dos quilombolas do Mato Dentro dos Forros e evidenciado na capa deste livro.

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