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Por que eu não aposto (ainda) no desenvolvimento de Itaguara

Imagem representando a decadência industrial de Itaguara-MG
Imagem representando a decadência industrial de Itaguara-MG

Recentemente, tive a oportunidade de entrevistar o prefeito eleito de Itaguara, Luan Brenner. Na entrevista, foi possível constatar sua visão sobre o desenvolvimento da cidade. Neste texto, quero explorar um pouco do que foi discutido e argumentar por que não acredito que Itaguara vá se desenvolver.


Introdução


Itaguara é uma cidade com um potencial latente, mas que enfrenta desafios econômicos que exigem mais do que boas intenções: demandam um planejamento estratégico robusto e de longo prazo. Como destaquei no artigo A necessidade de um plano municipal para o desenvolvimento de Itaguara, em que abordei aspectos centrais do desenvolvimento municipal, o município apresenta um PIB per capita baixo e salários médios inferiores à média regional. Esses indicadores são frutos de uma estrutura produtiva pouco diversificada e fortemente concentrada em setores de baixa complexidade. Diante desse cenário, o futuro econômico de Itaguara depende, de forma crítica, de uma visão que vá além da gestão reativa e assuma um compromisso com o desenvolvimento estrutural e sustentável da cidade.


A recente entrevista do Prefeito Luan Brenner, embora apresente um otimismo compreensível para um gestor em início de mandato, revela uma abordagem que, a meu ver, carece da profundidade e do alcance necessários para realmente impulsionar Itaguara para um novo patamar econômico. Minha "não-aposta" em Itaguara, neste momento, não é um ceticismo sobre o povo ou o território, mas uma preocupação com a visão de desenvolvimento que parece estar em curso.


Para Além do Óbvio


A análise da economia de Itaguara deve ir além da simples constatação dos baixos indicadores e da busca pela atração de empresas — embora estes sejam aspectos relevantes. A raiz do problema está na baixa complexidade econômica do município. Itaguara, assim como muitas cidades em Minas Gerais, possui uma força de trabalho predominantemente em setores de baixa produtividade (agropecuária e serviços não sofisticados). Essa concentração limita a capacidade de inovação, a criação de valor agregado e, consequentemente, a elevação dos salários e da qualidade de vida.


Além disso, a dependência de transferências intergovernamentais nas receitas municipais é um sinal de fragilidade. Um desenvolvimento econômico sustentável implica na capacidade do próprio município de gerar suas riquezas, por meio da expansão e diversificação de sua base produtiva. Sem atacar essa questão fundamental, qualquer esforço para "atrair empresas" pode se mostrar um paliativo, e não uma solução definitiva.


Boas Intenções, Pontos Cegos


O prefeito Luan Brenner demonstra estar ciente de alguns dos principais desafios enfrentados por Itaguara, como a baixa renda da população, deficiências na infraestrutura e a falta de dinamismo econômico local. Sua principal aposta — a criação de um bairro industrial e a atração de novas empresas — é, em teoria, uma iniciativa positiva. No entanto, o sucesso dessa estratégia depende, de forma crítica, de:

  • Qual tipo de empresa? Atrair indiscriminadamente qualquer empresa sem uma análise da vocação econômica da cidade e da capacidade de absorção de mão de obra qualificada pode gerar empregos de baixa remuneração, mantendo o ciclo da baixa complexidade. Na minha perspectiva, primeiramente existe a necessidade da identificação da vocação econômica e o engajamento em programas de investimento que visem a setores de maior valor agregado.

  • A questão imobiliária: A dificuldade na aquisição de terrenos não é um mero entrave logístico; é um reflexo de pressões urbanas e da falta de planejamento territorial que pode inviabilizar projetos de maior porte. A solução não é trivial e exige um planejamento urbano e fundiário que vá além da simples busca por áreas.

  • O "estruturar a cidade": Embora a infraestrutura urbana (água, saneamento, vias) seja fundamental, a prioridade dada a ela como um pré-requisito para o "deslanchar" do município corre o risco de postergar as ações mais complexas de desenvolvimento econômico. A infraestrutura é um meio, não um fim, para o desenvolvimento de uma economia diversificada e robusta.


O prefeito também reconhece a importância do planejamento. No entanto, a proposta de reservar parte do orçamento para “imprevistos” e para “apagar incêndios” contrasta com a lógica de um projeto de desenvolvimento baseado em diretrizes de longo prazo — capaz de antecipar desafios, reduzir incertezas e garantir a continuidade das políticas públicas, independentemente das mudanças de gestão. A própria necessidade recorrente de “apagar incêndios” é, em si, um indicativo da ausência de um planejamento estratégico eficaz.


Planejamento, Complexidade e Continuidade


Minha aposta em Itaguara só se concretizará quando o município abraçar uma abordagem holística e sistemática para o desenvolvimento, onde cada iniciativa se enquadre em um projeto maior e interconectado. Isso demanda:


  • A construção de um Plano Municipal de Desenvolvimento (PMD) abrangente: Mais do que um conjunto de intenções, o PMD deve ser um documento formal e vivo, com metas claras, indicadores de progresso e estratégias de longo prazo que orientem as ações de todas as gestões. Sua finalidade primordial é ir além da mera atração genérica de empresas, buscando, de forma articulada, a diversificação produtiva e o aumento da complexidade econômica do município, atendendo às necessidades e vocações locais.

  • Investimento estratégico em capital humano: Alinhado às metas do PMD, é fundamental aumentar a qualificação da mão de obra local. Isso significa desenvolver programas de capacitação e educação que atendam às demandas de setores mais complexos e com maior valor agregado, em consonância com a vocação produtiva identificada para a cidade. Sem esse capital humano qualificado, as novas empresas, mesmo que atraídas, não encontrarão o corpo de trabalho necessário para prosperar e gerar valor.

  • Engajamento proativo em programas de investimento e fomento: Em sintonia com o PMD, Itaguara deve buscar ativamente parcerias com instituições como SEBRAE e FIEMG. O objetivo é desenvolver estudos aprofundados e implementar programas que identifiquem e potencializem a vocação local, auxiliando na estruturação de cadeias produtivas de maior valor. A criação de um fundo de desenvolvimento municipal, conforme sugeri no plano, seria uma ferramenta crucial para catalisar essas iniciativas.

  • Integração Regional Estratégica: O desenvolvimento de Itaguara não pode ocorrer isoladamente. O PMD deve prever o posicionamento estratégico do município na macrorregião de Divinópolis e na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). Isso envolve a busca ativa por sinergias e complementaridades econômicas que, em vez de gerar concorrência predatória, impulsionem o crescimento de Itaguara por meio da cooperação e do aproveitamento de cadeias de valor regionais.

  • Desburocratização orientada por resultados: A simplificação de processos e a digitalização total da máquina pública devem ser pilares de uma estratégia de desenvolvimento que priorize eficiência, transparência e acessibilidade para o cidadão e o investidor. Não se trata apenas de reduzir etapas administrativas, mas de repensar o funcionamento do poder público para torná-lo um facilitador ágil e integrado do desenvolvimento econômico e social, sempre com base nas diretrizes do PMD.

  • Investimento em megaprojetos de infraestrutura como parte de uma estratégia maior: A realização de grandes obras, como a implantação de um gasoduto, deve estar inserida em uma estratégia estruturada de desenvolvimento territorial e ser integralmente alinhada ao projeto municipal de desenvolvimento. Embora possam ampliar a atratividade econômica e beneficiar setores produtivos, esses projetos exigem planejamento técnico rigoroso, análise de viabilidade e integração com políticas de capacitação profissional e incentivo à inovação. Eles não são, por si só, a solução para a baixa complexidade econômica. Isoladamente, correm o risco de se tornarem investimentos dispendiosos com retorno limitado. Contudo, quando bem articulados com a diversificação da base produtiva e a qualificação da mão de obra, podem, de fato, representar um motor na capacidade econômica do município.


Conclusão


Itaguara possui o potencial para se desenvolver, mas o caminho para o progresso econômico sustentável é complexo e exige mais do que a simples atração de empresas ou a melhoria da infraestrutura básica. Requer uma mudança de paradigma: de uma gestão reativa para uma gestão proativa, baseada em um planejamento de longo prazo que foque na elevação da complexidade econômica e na diversificação de sua estrutura produtiva.

Enquanto essa visão abrangente e estratégica não se tornar a espinha dorsal das políticas públicas de Itaguara, meu otimismo sobre o futuro econômico da cidade permanecerá contido. Minha aposta, por enquanto, fica suspensa, aguardando que o futuro traga um desenvolvimento que não seja apenas um "apagar de incêndios", mas a construção sólida de um futuro próspero e diversificado.


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